Análise | The Suicide of Rachel Foster - Ambiente brilhante ao serviço de uma narrativa controversa

Descobrir o passado pode ser tão fascinante quanto desconfortável — e The Suicide of Rachel Foster vive exatamente nesse limbo. Antes de mais, é importante deixar algo claro: este é um jogo que aborda temas extremamente delicados como o suicídio e a pedofilia. Se são assuntos que te causam desconforto, este não será, de todo, o jogo indicado para ti.

Um convite ao mistério… e ao desconforto

O que me atraiu inicialmente foi a estética do jogo. O cenário faz lembrar obras como The Shining, com aquele hotel imenso, vazio, gelado — onde o silêncio diz tanto quanto os próprios diálogos. Também há paralelos com jogos como Firewatch ou Gone Home, sobretudo no modo como se desenrola a exploração e como a narrativa vai sendo construída por meio da interação com o ambiente.

Durante as três a quatro horas de duração, o ponto mais forte da experiência é, sem dúvida, a ambientação. Tudo funciona muito bem nesse aspeto: o design de som, a iluminação, a direção artística e a qualidade das vozes criam uma atmosfera envolvente e tensa. O terror aqui é psicológico — nada de monstros a saltar do escuro ou sustos fáceis. É aquela sensação constante de que há algo (ou alguém) ali contigo, mesmo quando sabes que não devia haver.

Uma história que começa bem, mas não mantém o ritmo

A narrativa começa com força. Há mistério, há tensão, há camadas para desvendar. Infelizmente, a meio caminho, essa força esmorece. A história começa a arrastar-se, perde impacto e a jogabilidade não ajuda a manter o interesse. Algumas sequências são tão banais que parecem existir apenas para preencher tempo. Um exemplo claro disso: o momento em que temos de aquecer uma lata de feijões no micro-ondas — o jogo obriga-nos a esperar literalmente alguns minutos em frente ao aparelho sem fazer mais nada. Fiquei ali parado a pensar: “é mesmo isto o que querem que eu faça agora?”.

Apesar da tentativa de culminar num grande momento, o plot twist final acaba por ser previsível. Não é que seja mal executado, mas não surpreende. E num jogo deste género, onde se espera que a narrativa seja o centro, essa previsibilidade tira muito do impacto emocional que poderia (ou deveria) ter.

Uma abordagem controversa a temas delicados

É impossível falar de The Suicide of Rachel Foster sem mencionar a forma como lida com os seus temas centrais. O suicídio, embora presente desde o início da narrativa, acaba por ser tratado de forma superficial. Há uma tentativa de empatia, mas falta profundidade e cuidado — especialmente tendo em conta o peso que este tema tem na sociedade atual.

Mais grave ainda é a forma como o jogo apresenta e desenvolve o tema da pedofilia. Em vez de o condenar abertamente, o enredo trata-o com um certo romantismo deslocado e profundamente problemático. Há uma clara falha em reconhecer a gravidade do assunto. Em vez de servir como alerta ou reflexão, a narrativa parece, por vezes, suavizar algo que devia ser inquestionavelmente condenado.

Uma oportunidade perdida

No final, The Suicide of Rachel Foster fica marcado por aquilo que poderia ter sido. Tinha todos os ingredientes para criar uma história profunda e comovente, com uma atmosfera envolvente e mecânicas simples que permitissem focar na narrativa. Mas o equilíbrio entre forma e conteúdo não foi atingido. O ambiente brilha, mas a história perde-se. As decisões narrativas não só falham em emocionar como levantam questões éticas difíceis de ignorar.

Para quem é fã deste estilo de jogo — focado na exploração, na descoberta lenta e na narrativa — pode valer a pena experimentar, com expectativas ajustadas. Mas é difícil recomendá-lo sem ressalvas.

Pontuação Final: 4/10

 

📌 Ficha Técnica

Título: The Suicide of Rachel Foster
Género: Aventura narrativa / mistério psicológico
Duração média: 3–4 horas
Plataformas disponíveis: PC, PlayStation 4, Xbox One, Nintendo Switch
Plataforma utilizada para a review: PC
Público recomendado: Jogadores adultos que procuram narrativas intensas e estão confortáveis com temas sensíveis e pesados

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